terça-feira, 1 de abril de 2014

In memória dos sonhadores

Não entendo nada. Agulhas, fios, não entendo nada. Não faz mal, entender, também não é motivo, não ter motivo, só ter vontades. Mesmo assim, são muitas investigações pelo caminho, onde moram todos os esforços, e o que você coloca neles. A pele que ela disse que você não tem, e vai fazendo subir pêlos arrepios contínuos e a sensação de febre constante como se levasse infinitas e sucessivas vezes, o calor e o frio para constituir um mínimo de superfície Carne exposta, você não suporta o cheiro da carne crua nas lojas de carne. Não suporta, a pele retirada do corpo, o horror de desossar os frangos, são pequenos atos bárbaros no cotidiano. Você não acessa esse cheiro de morte que paira sobre os frigoríferos, nos dentes que mastigam, no pavor que sente e que diverte depois sorrisos das pessoas que você ama profundo. Só querer seduzir a si mesmo. O nojo. Um medo enorme. Grandes grades gralhas, armadilhas, enredos e engodos. Um martelinho na mão. Palavras que já estavam lá, peixes roubados do aquário rosa, quase cintilantes, tinham uma beleza insólita, e erravam de alvo, os tiros, a metralhadora que ele carrega é letal, está cheia de lodo escuro, de uma escuridão quase absoluta funestas. Os carros fúnebres, alegoria. Uma banda que toca o hino nacional nas ruas, ela anda de mãos dadas com adultos pela rua cheia de gente, tem bandeirinhas como as das festas de São João e algazarra, tem o som dos tambores, e uma alegria imunda pela rua. Ela ainda é criança e muito pequena não sabe que os generais mandaram matar todos os sonhadores daquela cidade, não sabe identificar o ar fúnebre que ronda e paira um cheiro de morte nos tambores que a banda bate com força e marcha na avenida principal da cidade.

(Primeiro, 16.01.2014)

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